terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Duo


Os olhos fitam o coração vazio

E o coração vazio fita os olhos que lacrimejam.

El Borracho

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Fugere Realitas


Te tenho em meus braços
Só minha, sozinha
Repousada em meu colo
Tão leve, tão linda

Te cubro de paz, de silêncio, calor
Liberto meu peito, esqueço meu ego
Me basta nós dois, só nós dois

E esqueço de tudo, de todos, do tempo
Me esqueço da dor de sentir-me vazio
Sou seu, entregue, sereno cordeiro
Perdido em um mar pacífico, flutuo

E a tempestade vem, chuva negra gelada
Trazendo em seu seio a realidade amarga

Sufoco meu instinto, paro
Sufoco o sentimento, recuo
E a realidade, como um trem-de-ferro, atropela a ilusão
E a ilusão luta, em vão

Desperto, volto a mim
Pálido, me deito, nas correntes ásperas, tão reais
E em um silencioso choro, peço

Pra que um dia não mais haja tempestade
Mas somente a eternidade da ilusão
O teu abraço, para sempre, a ocupar-me o espaço
E o teu sorriso, livre de fardos, a encorajar o meu.

Sheik Band-Aid

i como poeta


Como poeta fui
Como poeta quis
Como poeta tentei
Como poeta jazi

São versos simples, miúdos
Assim como me senti
Menor que o pingo que repousa (flutua)
Sobre a fina haste do i

Desiludido, solitário e
Com medo de cair
Sobre o chão duro e real
Que encerra a historia aqui.

k

terça-feira, 2 de novembro de 2010

Pergunta


O que acontece quando não se tem nada pra escrever, nada pra mostrar, nem pra si mesmo? Quando tudo o que se sente é a falta de sentir algo? Um pouco de raiva, de alegria, mas só tentativa. Tudo o que há é o nada, apatia. Um rio vazio em época de chuva.
O que acontece?

Le Petit Joseph

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Mareado


Pouco se diz através das palavras

As palavras são sacos vazios

Não dizem o que querem dizer

Pouco se diz através das ações

Que são meros arremedos do pensamento

Que já foi crivado pela realidade

Algo se diz quando se revela aonde

Na lágrima que o olho esconde

k

sábado, 24 de julho de 2010

Lívia


Quantas Lívias são necessárias para inspirar uma poesia?
Uma, duas, três?
Nem meia, nenhuma.

Apenas a idéia abstrata de uma Lívia se faz suficiente
Um modelo imaginário, bem distante, em pensamento
O desenho pincelado na memória de seu sorriso contra o vento
O delinear suave de seu doce olhar estampado em minha mente.

E então tu me perguntas:
E a vida sem sentido?

Sem sentido continua
Mas com gosto de chocolate, morango, sorvete.

Petardo Chantelle II

domingo, 18 de julho de 2010

Pontual


Chego lá banhado
Traje impecável, barbeado

Chego lá de unhas feitas
Bigode aparado, maquiado

Fantasiado de mim mesmo, cativante
Sorriso estampado, alegria contaminante
Coração pulsante, tímido, agoniado
Determinado sigo a frente ao local que foi marcado

Compareço de pé, com postura
De um doutor, senador, presidente
Destacado, ereto, atraente
Sem espaço para desventura

Indelével, assim, intocável
Como estátua à tua espera
E nas mãos um bouquet da mais bela
Flor-de-lis filha da primavera

Mas somente eu lá chegarei
Quando a porta fechada estiver
Bem trancada, assim, sete chaves
Cadeado, corrente, barragens

Mas somente eu lá estarei
Se estiveres bem longe de lá
Conspurcando meu nome já em casa
Pois cansaste de me esperar

E perante o local marcado
Pro encontro a luzes de velas
Engomado, frizado, contente
Dou as costas e volto calado

E da rua gelada eu escuto
No caminho de volta pra casa
Teus lampejos de gritos singelos
Que me lembram assim um duelo

Te imagino chorando sentada
Com o vestido atacado de lágrimas
E tuas mãos a rasgar minhas fotos
Contemplando meu ego com lástima

E à luz das estrelas do inverno
Retornando do encontro marcado
Sem te ver, sem te ter encontrado
Te desejo o amor mais sincero.

Petardo Chantelle

sexta-feira, 16 de julho de 2010

Um sonho de metal



Despertei de um lindo sonho
De paz, alegria, pleno amor
Estava eu pela cidade
Montado, audaz, em um trator

Enquanto pelas ruas andava
De alto posto contemplava
E inevitavelmente sorria
Quem em momento sublime fizera
Tão refinada engenharia?

As pessoas sorrindo fitavam
Pasmas como em torpor
Tão logo se recobravam
Aclamavam com louvor

Oh mestre tu permitistes
Nascer nas terras do senhor
Tão perfeita criação
Tal qual o próprio criador

O doce perfume que exalava
E a mais bela forma criava
Magnética atração
Não havia quem pudesse
Passar sem pedir perdão

Oh senhor favor permita
Minha humilde redenção
Erro e sei que não mereço
Mas por favor, me estenda a mão

Não deixe desamparado
Pobre homem que assim sofre
Permita que essas belas rodas
Sobre meu corpo, passem velozes

Ao exemplo do belo cordeiro
A multidão logo formava
Enfileirada e sem demora
Um batalhão de um bairro inteiro

Nesse momento despertei
Mas mesmo contente lamentava
Quisera sonhar um pouco mais
Sobre o trator que atropelava

E por somente um motivo
Pude então me aquietar
O que havia sido um sonho
Estava disposto a engendrar

K

quinta-feira, 15 de julho de 2010

Versos do cômodo



Com carinho, bem devagarinho
Aliso-te a face com a navalha
Com amor, cuidado e sensatez
Perfuro-te as bochechas uma só vez

Não se irrite, por favor
Que a raiva é sinônima de dor
Fique calmo, seja amigo
Pois aqui não há inimigo

Com ternura deslizo a lâmina
Por teu pescoço, farejando-te as entranhas
Com lealdade, te afago o peito
Com a ponta do aço, com todo o respeito

Tuas mãos atadas são para te proteger
De qualquer perigo que possa a ocorrer
O mundo lá fora te quer em uma cela
Quer-te condenado devido a uma donzela

Aqui neste cárcere estás protegido
Não há soldados, pois não és bandido
O pano na boca é para que saibas
Que nem sempre é hora de dizer palavras

O aço me pede ansioso de novo
Para alegre correr entremeio a seu corpo
E com destreza e concentração
Te rasgo veloz do ombro até a mão

Não chores amigo, o sangue é vida
E quando goteja me lembra magia
E quando espirra? Que doce cenário!
Me banho contente em rubro Rosário

Te acaricio, te desvendo os olhos
E a lâmina contente, me pede um presente
Não quer mais o inteiro, mas sim uma parte
Destarte prossigo com a veia da arte

Seguindo o desejo da prateada navalha
Que agora me lembra a lua de prata
Inspiro-me à beleza da luz do luar
E sou compelido a amputar-te o anelar

Não se irrite amigo, pois é protegido
Do mundo lá fora, da lei, dos perdidos
Aqui tens carinho, cuidado, atenção
Por toda a vida aqui no porão

Não sintas sozinho, pois logo retorno
Trazendo bandagens, remédios e cloro
Bandagens azuis, laranjas, vermelhas
Com cheiro de bem, saúde e beleza

Cuidar de um amigo tornou-se uma sina
Por todos os dias, por toda a vida
Não temas, meu caro, pois a hemorragia
Tão fácil se estanca com a enfermaria

Não te vás lá fora enquanto me ausento
Pois são inimigos, te querem em um assento
No banco dos réus, a condenação
Aqui tens a mim, aqui tens irmão.

Petardo Chantelle

terça-feira, 13 de julho de 2010

Santidade dos céus


Eu a vejo lá no alto. É muito alto, ela é apenas silhueta. Posso sentir o vento defrontando seu corpo. Que vento forte!

Vinte andares, arranha-céu. Ela linda, vestido branco, cabelos castanhos. Cabelos que dançam conforme a canção do vento, do vento lá no alto. Parapeito, braços abertos, janela aberta.

Silhueta. Braços abertos, no parapeito. Eu a vejo, bela donzela. Olhos fechados a espera de uma queda. Esperando por ajuda, por uma voz, por uma chance.

Ela tem medo? Menina mulher, braços abertos, vento, vestido, amor, pensamento. Ela tem medo?

Sim, mas não grita. Teme, mas não chora.

Posso salvá-la? Posso amá-la, reconquistá-la? Posso, sei que posso. Posso, sei que vou. E vou, vou amá-la. Sim, vou salvá-la. Nunca deixá-la, nunca, por nada.

Eu grito seu nome, grito em fantasia. Grito e aflito invoco sua atenção.
Ela me olha, ela me quer. Ela me ouve.

Não sou perfeito, sou um amante, apenas um elo entre a beleza e a pureza.

Grito seu nome, ela escuta. Grito em pensamento, em voz, em luta.

Pula que te quero bem. Pula que te quero bem. Pula, meu amor sincero.

E ela me ouve, linda donzela. Ela me ouve, pois me quer. E a queda, sem esforço, e a queda sem esforço, transforma-se em sonho real. O vestido branco, como pára-quedas. Como um pára-quedas inoperante.

E despedaça, e se desmembra, e sua cabeça e pernas se corrompem em explosão em tom de magia. Encontro de carne e chão, vento e sangue.

Pula, minha elfa, que te quero bem.

Petardo Chantelle

domingo, 11 de julho de 2010


Faltavam 10 minutos para a aula começar
e então ele teve uma idéia
se eu escrevesse alguma coisa e a falasse antes do seminário talvez aquilo chamasse a atenção do professor...
rabiscava a folha de caderno rasgada enquanto tomava café naquela mesa de plástico vermelha
o pensamento vinha mais rápido que o movimento da mão
o papel grudou na mesa suja de café
letras ilegíveis para qualquer outro ser humano, falta de prática, pouco capricho...
ele leu aquilo pra si mesmo:

falta de sensibilidade
porque ele disse aquela maldita palavra
o virtual acaba com a poesia
cada vez que eu ouço o som do teclado some uma parte do meu pensamento
o virtual não tem a sensibilidade do papel riscado com grafite

ele gosta de arte, talvez se impressione, mas não por algo assim... dane-se...

ele continuou:

as idéias vêm de repente e assim que eu levanto a tela do computador elas se vão, sempre,
sobram fragmentos...
não há opção de desfazer, aquilo se apagou e nunca mais volta
meus pensamentos pertencem a mim, fora da minha cabeça eles não fazem sentido
eu sei, é possível organizar as idéias, mas elas nunca serão mesmas, não serão tão boas
do lado de fora elas são meras traduções simbólicas de uma linguagem muito mais complexa que esta
aqui elas são preto, branco, letra, nada, pixel, nada...
angustiante incompatibilidade

K

sexta-feira, 9 de julho de 2010

Alegoria da fuga


Ela corria.
E seu coração acelerava a cada lembrança do estalo do chicote.
E ela corria, não parava.
E teus belos pés, antes puros, agora se disfarçavam em sangue.
E tudo a sua volta reluzia. A noite virou dia.
E ela não parava, apenas corria. Sua mente agitada em chamas só atrapalhava o passo a passo de seus pés. O estalo da chibata era o único som que agora, tão bela donzela, nua donzela, conhecia.

Entre as folhas, rosas, árvores. Nua, corria.
Pele alva tingida de vermelha, sangue azul vertido em cachoeira. E derramava, escorria.
E por mais que ela corresse, ela saberia. Que um dia, um dia.
O chicote não mais som seria. Mas o encontro encantado, nostálgico, de sua pele alva e pura com os gomos perfeitos e afobados de seu entrelaço.
Não apenas som seria, mas a marca viva da união transcendental entre sua dor e o estalo.
Que só ela conhecia.
E ela corria.

Petardo Chantelle

quarta-feira, 7 de julho de 2010

Prólogo

Nasceu ás pressas, sem manta de coberta, sem demais palestras
Nasceu fecundo, produto da paz e dor
Assim se fez, se criou, se lançou
O poeta do amor.